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A Cosmologia da Idade
Média |
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O que foi a Idade Média?
Os
historiadores dividem esquematicamente a história da Europa em
três "idades": a civilização clássica da Antiguidade, a Idade
Média e os Tempos Modernos.
A Idade Média também é
comumente chamada de período medieval ou época medieval. O
nome "Idade Média" ("medium ævum") foi cunhado pelo humanista
italiano Flavio Biondo no início do século XV.
Tradicionalmente dizemos que a Idade Média na Europa
Ocidental começou quando o Império Romano do Ocidente cessou
formalmente de existir no ano 476 (século V). No entanto é
extremamente difícil decidir quando a Idade Média terminou. Os
historiadores consideram que isso ocorreu em datas diferentes
dependendo do local da Europa que estamos considerando.
Podemos supor que a Idade Média terminou quando houve a
ascensão das monarquias nacionais, ou o começo da exploração
dos mares pelos europeus, ou no despertar humanista ou então
na Reforma Protestante iniciada em 1517. Estas várias mudanças
marcam o começo do chamado Período Moderno Inicial, que
precede a Revolução Industrial.
Sob este ponto de
vista histórico o Mundo Antigo inclui os primeiros 500 anos do
Império Romano enquanto que a Idade Média cobre os 1000 anos
finais da longa história de 1500 anos do Império Romano.
A Idade Média frequentemente é subdividida em três
períodos: alta, clássica e baixa. Essa subdivisão passou a ser
usada após a Primeira Guerra Mundial e é consequência dos
trabalhos de Henri Pirenne, em particular seu artigo "Les
periodes de l'historie du capitalism", publicado no Bulletin
de la Classe des Lettres da Academie Royale de Belgique, em
1914, e também dos trabalhos de Johan Huizinga, autor de "The
Autumn of the Middle Ages", publicado em 1919.
A Alta
Idade Média, também chamada de Idade Média Antiga, vai do
século V ao X. Este foi um período de formas inconstantes de
governo, um nível relativamente baixo de atividade econômica e
de incursões bem sucedidas feitas por vários povos não
Cristãos tais como os eslavos, os árabes e os escandinavos. O
período que vai do século V ao século VIII é algumas vezes
chamado de "Idade das Trevas".
A Idade Média Clássica,
também chamada de Idade Média Plena, se estende do século XI
ao final do século XIII/início do século XIV. Este período se
caracteriza pela cultura expansionista e pelo renascimento
intelectual. Este é um período de crescente poder real, de
aumento dos interesses comerciais e do enfraquecimento dos
usuais laços de dependência, especialmente após a peste que
ocorreu no século XIV. É nesse período que temos as
instituições desenvolvidas, o domínio dos lordes e o
crescimento da vassalagem, a construção de castelos e combates
a cavalo, e o resuscitamento da vida urbana e comercial.
A Baixa Idade Média, também chamada de Idade Média
Tardia, corresponde aos séculos XIV e XV, indo de cerca de
1300 a 1500. Politicamente esta era foi tipificada pelo
declínio do poder feudal e sua substituição pelo
desenvolvimento de fortes nações-estado baseadas na realeza.
O Universo na Idade Média
O Império
Romano não produziu qualquer progresso científico em nossa
compreensão do universo. A maior parte do conhecimento dos
gregos foi esquecida e os registros que existiam na biblioteca
de Alexandria foram perdidos.
Na Idade Média
floresceram idéias mitológicas sobre o universo.
Depois do declínio do Império Romano, os contatos
feitos pelos Cruzados do ocidente com o mundo árabe fizeram
efervescer novas idéias.
A Idade das Trevas
No ano 476 o último imperador romano do ocidente,
Rômulo Augústulo, foi deposto. Várias tribos bárbaras, tais
como os Ostrogodos, Visigodos, Suevos, Alamanos, Saxões, e os
Vândalos, já tinham realizado uma série de invasões por toda a
Europa, saquendo e rompendo a estabilidade política de toda a
região.
Com a queda final
do império romano do ocidente, no século 5, a escuridão desceu
sobre a Europa. Todas as
atividades intelectuais definharam na mão dos chamados "povos
bárbaros". O rompimento das relações sociais fez com que a
principal preocupação fosse a sobrevivência.
O
Cristianismo foi racionalizado pelo conhecimento judaico e
grego que ainda tinha sobrevivido em Alexandria. Sua
disseminação foi muito ajudada pela rede de comunicação que
havia sido criada pelo Império Romano que, naquele momento, já
estava se desintegrando.
Os historiadores consideram
que o pior período da Idade Média foi a sua fase inicial. A
ela foi dado o nome de "Idade das Trevas", embora haja muitas
vozes discordantes sobre o que esta fase realmente significou
para a humanidade.
Na Idade das Trevas a discussão
sobre o universo retrocedeu muito. Voltou-se a ter uma
polarização mitológica entre o céu e o inferno. Para o homem
comum a Terra voltava a ter a forma de um tabernáculo
retangular, plano, circundado por um abismo de água. Se
olharmos para o que as civilizações já haviam criado para
descrever o Universo, vê-se que este realmente foi um
monstruoso retrocesso.
No entanto, alguns sábios da
época, tais como Boethius e o Venerável Bede, estavam a par da
ciência grega através das anotações em latim que Cícero,
Plínio e outros filósofos haviam deixado. Boethius, romano de
origem nobre, preservou o conhecimento existente sobre a
lógica e a matemática. Foi ele quem traduziu os textos de
lógica de Aristóteles, além de outros trabalhos de Pitágoras e
Euclides. Assim, embora o saber europeu estivesse no seu mais
baixo nível após muitos séculos, ainda sobreviviam resíduos do
conhecimento antigo, principalmente em locais como Bizâncio,
Siria e na antiga Pérsia.
Somente no século 11 é que a
Idade das Trevas começou a ser dissipada, com o surgimento de
escolas e, mais tarde, universidades. Novas importantes idéias
também apareceram como, por exemplo, o conceito de que é
necessário primeiro compreender para então acreditar.
O mapa ao lado mostra o florescimento das
universidades em toda a Europa por volta do século 12. As
universidades daquela época eram produtos de um sistema de
associações. Existiam quatro faculdades que
estavam voltadas para arte, teologia, lei e medicina. Haviam
também sete artes liberais: a gramática, retórica e lógica
formavam o chamado "trivium" enquanto que a aritmética,
geometria, música e astronomia formavam o "quadrivium".
Nos séculos 12 e 13 durante o declínio do
império islâmico, acelerado mais ainda no século 14 pela
invasão dos Mongóis, os trabalhos de Aristóteles, Euclides,
Ptolomeu e vários outros foram traduzidos para o latim.
Primeiramente eles foram traduzidos do árabe mas, mais tarde,
isto foi feito diretamente a partir dos originais gregos.
Thomas Aquinas (Tomás de Aquino), um dos principais
representantes do pensamento da Idade Média, foi quem mostrou,
no século 13, de que forma o cristianismo podia ser acomodado
dentro do universo Aristotélico, necessitando apenas de
modificações relativamente superficiais. Segundo as suas
idéias os seres humanos mantinham a imortalidade mas, no
entanto, o universo adotado perdia a sua eternidade uma vez
que ele tinha sido criado por Deus.
Suas idéias logo
sofreram adaptações suplementares. Para o escritor Dante
Alighieri (1265-1321), autor da "Divina Comédia" (1306-1321),
o inferno era uma região inferior dentro da Terra, o
purgatório era a região sublunar e as regiões etéreas eram os
locais ideais para a residência de hierarquias superlunares de
seres angelicais (imagem abaixo).
Também é no século XIII
que surge um outro importante membro do pensamento da Idade
Média: Sacrobosco. Também conhecido como John Halifax, John de
Holywood ou então Johannes de Sacre Bosco, Sacrobosco nasceu,
não se sabe em que ano, em Yorkshire, Inglaterra, e faleceu em
1256. Ele foi educado em Oxford e ensinou matemática na
Universidade de Paris. Sacrobosco foi o primeiro europeu a
escrever sobre o sistema de Ptolomeu. Seu livro "Sphoera
Mundi" foi o mais importante livro texto de astronomia por
cerca de 400 anos. A razão disso foi a introdução dos tipos
móveis na imprensa por volta do ano 1440 por Johannes
Gutenberg (~1397-1468). O "Sphoera Mundi" foi um dos primeiros
livros de astronomia impressos em todo o mundo, dai a sua
grande divulgação. Entre 1472 e 1500 este livro teve 25
edições. Por volta de 1650 ele teve mais 40 edições. A
descoberta de Gutemberg tornou mais fácil os meios educados da
Europa terem acesso à ciência embora isso não significasse
muito para a população comum, em sua maior parte analfabeta.
A imagem abaixo faz parte de uma edição de 1537 do
livro "Sphoera Mundi". Nela vemos Sacrobosco escrevendo seu
livro.
Os pequenos desenhos localizados
dentro da borda desta ilustração mostram os planetas. Marte
está no canto inferior esquerdo, Mercúrio está no centro a
esquerda, Vênus está no centro a direita, Saturno está no
canto inferior direito e Júpiter está na parte de baixo ao
centro da imagem. Na parte de cima desta borda são mostrados
instrumentos usados para medir espaço tais como o esquadro, no
canto superior esquerdo, e o dióptro, no canto superior
direito. Também são mostrados instrumentos para medir o tempo
tais como a ampulheta, a esquerda do centro, e o relógio de
sol portátil, a direita do centro. Espalhados pela borda estão
ícones que representam outros estudos matemáticos, música e o
desenho em perspectiva. Também são mostrados os símbolos para
os pólos celestes: "acticus", na parte superior esquerda
(deveria ser "arcticus") e "antar", abreviação de
"antarcticus" na parte superior direita. Estes símbolos estão
acompanhados por pequenos desenhos da constelação Ursa Maior.
Na parede atrás de Sacrobosco estão pendurados seus
instrumentos de observação, o quadrante e o astrolábio, assim
como seus instrumentos de projetos, o compasso e o esquadro.
Por ter muitas ilustrações o livro "Sphoera Mundi" de
Sacrobosto tornou-se bastante útil. Mesmo se os leitores não
conseguissem compreender todo ou a maior parte do texto, eles
poderiam ainda assim aprender bastante por meio das várias
ilustrações ali apresentadas. Mostramos abaixo uma destas
ilustrações, que explica os eclipses lunares (parte de cima) e
solares ( parte de baixo). Ela faz parte da edição de 1491 do
livro de Sacrobosco.
Curiosamente, as edições posteriores
do livro "Sphoera Mundi" de Sacrobosco incluiam ilustrações
móveis, chamadas "volvelles" que os leitores podiam girar para
melhor compreender os fenômenos celestes que variavam. A
imagem abaixo mostra uma "volvelle" pertencente a uma edição
de "Sphoera Mundi" feita por volta do século XVI. Ela
representa um eclipse lunar.
A imagem abaixo, que também pertence
ao "Sphoera Mundi" de Sacrobosco, mostra a visão do universo
que ele divulgava, puramente Ptolomeus.
Suas crenças estão bem claras nesta
imagem onde Ptolomeu é colocado como príncipe ao lado da deusa
da Astronomia, Urania.
Por volta do século 14 o universo
medieval atingiu o seu maior desenvolvimento. Ele agora era
antropocêntrico e foi santificado pela religião, endossado
pelos filósofos e racionalizado pela ciência geocêntrica.
Essas idéias permaneceram ainda em vigor ao longo de
todo o século XV apesar de já estarmos em plena Renascença. No
ano de 1493 foi publicada uma história ilustrada da Terra, que
descrevia de sua criação até 1490. Este livro, "A Crônica de
Nuremberg", também chamado de "O Livro de Crônicas desde o
Começo do Mundo", foi compilado por Hartmann Schedel, com
ilustrações e gravuras de Michael Wohlgemuth, Wilhelm
Pleydenwurff e Albrecht Dürer, e impresso e publicado por
Anton Koberger. Este maravilhoso trabalho de arte, hoje um dos
principais itens dos colecionadores de livros, continha 1809
impressões obtidas de 645 gravuras originais de madeira. Entre
suas belíssimas imagens encontramos uma que nos descreve o
universo. Ela nos mostra o ponto de vista medieval da ciência,
isso já em pleno século XV.
Também mostramos abaixo um painel que
é parte de uma pintura feita por Hieronymous Bosch em 1504.
Ela se chama "O Jardim dos Prazeres Terrestres" e é chamada de
"tríptico" por ser constituida por três grandes partes.
Provavelmente essa pintura foi feita para a diversão
particular de alguma família nobre. O painel central, que não
é mostrado aqui, apresenta um jardim de delícias, de onde vem
o nome da pintura. A parte da pintura mostrada aqui é de uma
das venezianas externas e representa uma visão medieval do
terceiro dia da criação, incluindo uma Terra plana, com nuvens
flutuando em um firmamento esférico, e um vazio circundando a
bolha esférica que envolve a Terra.
Esta visão do universo não era predominante nem
amplamente partilhada pelos membros educados da sociedade na
Idade Média, que certamente tinham herdado muito do seu
conhecimento astronômico a partir de documentos como o
Almagesto e outros. No entanto, esta visão tinha uma certa
influência entre os membros do público geral.
Um
resumo da Cosmologia da Idade Média
- a ciência grega tinha estabelecido que Terra era o apex
(o ponto mais alto) do Universo em um sentido físico.
- a igreja institucional elaborou um significado desta
interpretação nas Sagradas Escrituras e adotou o esquema de
Ptolomeus.
- abaixo da Terra estava o inferno, evidenciado pelos
vapores abrasadores que é lançado pelos vulcões.
- acima estavam sete esferas nas quais o Sol e os planetas
giram em torno da Terra.
- a oitava esfera era uma abóbada imóvel sobre a qual as
estrelas se penduravam como lâmpadas.
- a nona, ou esfera cristalina, era a residência dos
santos.
- acima de tudo, na esfera número dez, estava a residência
de Deus Todo Poderoso, chamada Paraíso ou o Firmamento.
- esta teoria de cosmologia tendeu a ser cada vez mais
aceita como fato.
As teorias de Ptolomeus e
Aristóteles dominaram a astronomia/cosmologia por
aproximadamente 14 séculos. O sucesso do universo
Ptolomaico-Aristotelico deve-se a:
- a beleza intrínseca de seus conceitos e ao fato de
estarem em acordo com as filosofias da época.
- eram amplamente bem sucedidas em explicar as
observações. Lembre-se que as paralaxes das estrelas ainda
não eram conhecidas e os telescópios ainda não existiam.
- ter sido adotada pela poderosa Igreja Católica durante a
Idade Média como dogma.
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