PSEUDOCIÊNCIAS

SEU KIT DE DEFESA CONTRA A ASTROLOGIA

Prof. Alberto Ricardo Präss - www.fisica.net

Acontece com todos nós - astrônomos profissionais, amadores, ou "entendidos" em geral. Comentamos com alguém o nosso interesse nos céus e rapidamente nos encontramos mergulhados em um debate sobre astrologia. Para muitos de nós é difícil saber como responder polidamente a alguém que leva a sério esta antiga superstição. A revelação de que a programação diária na Casa Branca de Reagan era feita com base nas previsões de um astrólogo de São Francisco tem canalizado novas atenções para o problema da alta aceitação pública da astrologia. Mais do que nunca, os astrônomos estão sujeitos a serem defrontados com desafios a respeito do valor e da eficácia da astrologia. Neste sentido, eis aqui um guia prático para algumas das respostas que você pode dar as questões levantadas por astrólogos.

 

AS DOUTRINAS DA ASTROLOGIA

 

A base da astrologia é surpreendentemente simples: o caráter e o destino de uma pessoa podem ser determinados a partir das posições do Sol, Lua, e planetas no momento do nascimento. Interpretando a localização destes astros, utilizando uma carta chamada horóscopo, os astrólogos pretendem prever e explicar o curso da vida, e ajudar pessoas, companhias e nações a tomar decisões do grande importância.

 

Por mais improváveis que estas pretensões possam parecer a alguém que saiba o quê realmente são o Sol, a Lua e os planetas, e a que distância estão de nós, o Instituto Gallup, em 1984, revelou que 55% dos adolescentes americanos acreditam em astrologia. Além disso, milhares de pessoas, diariamente, tomam decisões médicas, profissionais e pessoais, de importância crucial, baseadas em conselhos recebidos de astrólogos e publicações astrológicas.

 

Os detalhes precisos da origem da astrologia estão perdidos na antiguidade, mas a astrologia tem milhares de anos de existência e aparece sob muitas formas em muitas culturas. Ela floresceu em um tempo em que a visão humana do mundo era dominada por mágica e superstição, quando a necessidade de compreender Os desígnios da natureza era geralmente uma questão de vida ou morte.

 

Objetos celestes, naqueles dias, eram considerados como deuses, espíritos poderosos, ou, no mínimo, símbolos representativos de personagens divinos que gastam seu tempo brincando com o dia-a-dia dos humanos. As pessoas procuravam ansiosamente por sinais celestes que indicassem o que os deuses iriam fazer em seguida. Visto neste contexto, um sistema que conectasse os planetas brilhantes e as constelações zodiacais com questões existenciais era atraente e tranquilizador. E, mesmo hoje, apesar do todo o esforço da educação científica, a atração da astrologia sobre muitas pessoas não diminuiu. Para elas, pensar em Vênus como um mundo desértico coberto de nuvens é muito menos interessante do que vê-lo como um ajudante para decidir com quem se casar.

 

PERGUNTAS EMBARAÇOSAS

 

Um bom modo do começar a pensar na perspectiva astrológica é fazer uma análise crítica, porém bem-humorada, das consequências lógicas de algumas de suas reivindicações:

 

1. Qual é a probabilidade de que 1/12 da população da Terra esteja tendo o mesmo tipo de dia? Escritores de colunas astrológicas (que aparecem em mais de 1200 jornais diários só nos Estados Unidos) defendem que você pode saber alguma coisa sobre o seu dia lendo um dos 12 parágrafos no jornal matutino. Uma simples divisão mostra que 400 milhões de pessoas em todo o mundo irão todas ter o mesmo tipo do dia, todos os dias. Isto torna claro porquê as provisões astrológicas usam a linguagem mais vaga e geral possível.

 

2. Por que é momento do nascimento, e não o da concepção, é crucial para a astrologia? A astrologia parece ser científica para algumas pessoas porque o horóscopo é baseado em um dado exato: a hora do nascimento. Quando a astrologia foi estabelecida há muito tempo atrás, o momento do nascimento era considerado o mágico momento da criação da vida. Mas hoje sabemos que o nascimento é culminação do nove meses do desenvolvimento contínuo dentro do ventre da mãe.

 

Na verdade, cientistas acreditam hoje que muitos aspectos da personalidade da criança são estabelecidos bem antes do nascimento.

Suspeitamos que a razão pela qual os astrólogos ainda consideram a hora do nascimento tem pouco a ver com a "teoria" astrológica. Quase todos os clientes sabem quando nasceram, mas é difícil (e talvez embaraçoso) identificar o momento exato da concepção.

 

3. Se o ventre materno pode manter influências astrológicas afastadas até o nascimento, por que não se pode fazer o mesmo com um envoltório de tecido humano? Se forças tão poderosas emanam dos céus, por que elas são inibidas antes do nascimento por uma fina camada do músculos, carne e ossos? Se o horóscopo potencial de um bebê for desfavorável, nós não poderíamos atrasar a ação das influências astrológicas envolvendo o recém-nascido em tecido humano até que os sinais celestes fossem mais propícios?

 

4. Se os astrólogos são tão bons assim, por que eles não são mais ricos? Alguns astrólogos dizem que elos não podem prever eventos específicos, apenas tendências. Outros dizem ser capazes do antever grandes eventos, mas não pequenos acontecimentos. De qualquer modo, os astrólogos poderiam ganhar bilhões prevendo, por exemplo, o comportamento do mercado de ações, e portanto não teriam que cobrar altas taxas a seus clientes. Em outubro de 1987, quantos astrólogos previram a "Black Monday" na bolsa de Nova York e preveniram seus clientes?

 

5. Os horóscopos feitos antes da descoberta dos três planetas mais exteriores são incorretos? Alguns astrólogos defendem que o signo solar (a localização do Sol no zodíaco no momento do nascimento), o que é usado exclusivamente por muitos jornais, é um guia inadequado para os efeitos do cosmo. Estes praticantes "sérios" (geralmente aqueles que não conseguem entrar no lucrativo negócio das colunas em jornais) insistem que a influência do todos os principais corpos do Sistema Solar deve ser levada em conta - incluindo Urano, Netuno, e Plutão, que não foram descobertos até 1781, 1846, e 1930, respectivamente.

 

Neste caso, o que acontece com todas as previsões feitas antes da descoberta destes astros? Todos os horóscopos feitos antes de 1930 estavam errados? E por que as imprecisões dos horóscopos anteriores não levaram os astrólogos a deduzir a presença de Urano, Netuno e Plutão muito antes dos astrônomos? E se os astrônomos encontrarem um décimo planeta? E os asteróides e as grandes luas dos planetas exteriores.

 

6. Nós não deveríamos condenar a astrologia como uma forma de discriminação? Numa sociedade civilizada são deplorados todos os sistemas que julgam indivíduos meramente por sexo, cor da pele, religião, pátria de origem, e outros acidentes de nascimento. Mesmo assim, os astrólogos defendem que podem avaliar pessoas com base num outro acidente de nascimento -a posição dos corpos celestes. Será que recusar-se a sair com uma leonina ou não contratar um virginiano não é tão preconceituoso quanto não sair com uma católica ou não contratar um negro?

 

7. Por que diferentes escolas da astrologia discordam tão fortemente entre si? Astrólogos parecem discordar nos mais fundamentais aspectos de sua arte: se incluem ou não a precessão do eixo da Terra, quantos planetas e outros objetos celestes podem ser incluídos, e - o que é mais importante -quais tendências de personalidade acompanham os fenômenos cósmicos. Leia 10 colunas astrológicas diferentes, ou tenha uma previsão feita por 10 diferentes astrólogos, e provavelmente você terá 10 interpretações diferentes.

 

8. Se a astrologia é uma ciência, como os seus proponentes defendem, por que os seus praticantes não convergem para uma teoria de consenso depois de milhares de anos coletando dados e refinando suas interpretações? Idéias cientificas geralmente convergem com o passar do tempo, na medida em que são testadas no laboratório ou comparadas com fatos. Por outro lado, sistemas baseados em superstição ou crenças pessoais tendem a divergir na medida em que seus praticantes criam nichos distintos enquanto lutam por poder, dinheiro ou prestigio.

 

9. Se a influência astrológica é veiculada por alguma força conhecida, por que os planetas dominam? Se os efeitos da astrologia podem ser atribuídos à gravidade, a forças de maré, ou ao magnetismo (cada um é invocado por uma escola diferente), até mesmo um aluno iniciante de Física pode fazer os cálculos necessários para saber o que realmente afeta um bebê recém-nascido. Por exemplo, o obstetra que faz o parto do bebê possui seis vezes mais atração gravitacional do que Marte, e aproximadamente dois trilhões de vezes sua força de maré. O médico pode ter uma massa muito menor do que a do planeta vermelho, mas está bem mais perto do bebê!

 

10. Se a influência astrológica é veiculada por alguma força desconhecida, por que esta é independente da distância? Todas as forças de longo alcance conhecidas no universo tomam-se mais fracas à medida que os objetos ficam mais distantes entre Si. Porém, como se pode esperar do um sistema centrado na Terra e concebido milhares de anos atrás, as influências astrológicas independem completamente da distância. A importância de Marte no seu horóscopo é idêntica que o planeta esteja do mesmo lado do Sol em que a Terra se encontra, que é sete vezes mais distante, do outro lado. Uma força que não depende da distância seria uma descoberta revolucionária.

 

Se as influências astrológicas não dependem da distância, por que não existe astrologia de estrelas, galáxias, e quasares? O astrônomo francês Jean-Claude Pecker lembra que os astrólogos parecem ter uma visão bastante curta por limitarem sua arte ao nosso sistema solar. Bilhões de estupendos corpos em todos os confins do universo deveriam adicionar sua influência aquela proporcionada pelos nossos pequeninos Sol, Lua e planetas. Será que um cliente cujo horóscopo omite os efeitos de Rigel, do pulsar do Caranguejo, e de M31 realmente recebe uma interpretação completa?

 

Andrew Fraknoi, Astronomical Society of the Pacific

Traduzido e adaptado com permissão da revista "Sky & Telescope" por João Braga e Carlos A. Wueneche, Instituto de Pesquisas Espaciais -INPE.

 

 

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LEMBRE-SE!

Uma pseudociência é qualquer tipo de informação que se diz ser baseada em fatos científicos, ou mesmo como tendo um alto padrão de conhecimento, mas que não resulta da aplicação de métodos científicos.